Publicado por Redação em Notícias Gerais - 01/04/2014

Investimento e poupança

Economistas defuntos e heréticos, John Maynard Keynes, Joseph Schumpeter e Hyman Minsky dissentiam dos que acreditavam que o investimento dependia da poupança. O descrédito não se limitava a recusar o axioma clássico, neoclássico ou austríaco que afirma a poupança prévia como condição para "financiar" o investimento.
 
Para os heréticos, a anterioridade da poupança é uma sobrevivência da economia natural. Nessa concepção, a taxa de juro é a recompensa da espera (renúncia ao consumo presente) e o dinheiro funciona apenas como unidade de conta e meio de circulação e não como a forma geral da riqueza, conceito sem o qual não se compreende a natureza do processo de produção capitalista. Nele o dinheiro é pressuposto inescapável da compra dos meios de produção e da força de trabalho e finalidade incontornável do que foi produzido.
 
Na Economia Monetária da Produção, a origem do processo de criação de valor incorporado nos bens é o gasto financiado pela disponibilidade de recursos líquidos sob o controle do sistema de crédito. Ao adiantar recursos líquidos para os empreendimentos, o sistema de crédito torna possível não só o financiamento da produção corrente, mas, sobretudo, adianta recursos monetários para a criação de novas empresas ou adições à capacidade produtiva.
 
A decisão de investir é complexa porque requer a apreciação das várias dimensões da riqueza nova que se imagina criar
 
As decisões de produção na economia monetária suscitam a demanda de moeda para transações e para o financiamento do investimento (finance). Essa demanda que pode ser satisfeita pela "criação" de liquidez pelos bancos, atendida pelos saldos monetários inativos dos próprios possuidores de riqueza ou alcançada pela colocação no mercado de títulos de dívida ou de direitos de propriedade. Ao financiar o gasto, os adiantamentos de liquidez movem a circulação monetária e fazem crescer os depósitos dos bancos e as reservas bancárias, ao mesmo tempo em que impulsionam o aumento do emprego, da renda e, portanto, determinam variações no "estoque" de poupança agregada.
 
Operando num regime de reservas fracionárias e, sobretudo, sob a proteção de uma instituição central provedora de liquidez e redutora de riscos, os bancos desfrutam de uma condição peculiar: a prerrogativa de multiplicar depósitos, isto é, passivos bancários que são aceitos como meios de pagamento. Estes depósitos podem ser movimentados por seus titulares com o propósito de adquirir bens e serviços ou de liquidar contratos.
 
A economia monetária em que prevalecem as relações de débito e crédito pode ser concebida como grande painel de balanços inter-relacionados. As decisões privadas de gasto apoiadas no adiantamento de liquidez são as variáveis independentes. A disposição de bancos e empresas de abrir mão da liquidez promove a geração do fluxo de renda agregada da economia. Sobre a renda já criada (salários, lucros e demais rendimentos) incidem as decisões de poupar que modificam a distribuição dos estoques de direitos sobre a riqueza e, portanto, a situação patrimonial dos protagonistas. Os fluxos de lucros, salários e receitas fiscais produzidos no processo de criação de valor engendram as poupanças que vão constituir o "estoque" de poupança agregada.
 
O ponto crucial para Keynes diz respeito aos requisitos para a concretização do investimento, o verdadeiro ato de criação de nova riqueza. A decisão de investir é uma decisão complexa porque requer a apreciação das várias dimensões da riqueza nova que se imagina criar. Tratando-se de um capital real (instrumental), a nova riqueza é materialmente definida, ou seja, serve ("facilita", segundo a expressão utilizada por Keynes) à produção de determinado bem (ou bens). O desejo de criá-la não é, por isso, um desejo abstrato de "possuir mais riqueza", como no ato de poupar. O desejo de riqueza, neste caso, está relacionado com a posse e utilização de um ativo especializado cuja avaliação depende de: 1) sua capacidade de sobreviver à concorrência e à substituição tecnológica; 2) da demanda esperada pelo bem ou bens em cuja produção pode "servir"; 3) dos custos de produção projetados, etc).
 
No capitalismo, a posse de ativos instrumentais exige, além da amortização de seu próprio custo de reprodução, a geração de excedente de valor ao proprietário. Esse é o conceito de eficácia marginal do capital.
 
Isto impõe aos proprietários privados das formas particulares e especializadas da riqueza a dura e penosa obrigação de submeter seus haveres ao tribunal dos mercados de riqueza, ou seja, à avaliação e reavaliação de seus rendimentos vis-a-vis com os rendimentos dos demais ativos, aí incluído o dinheiro, ativo dotado do prêmio de liquidez.
 
A taxa de juros desconta - traz para o presente - o valor da capacidade estimada do fluxo líquido de ganhos futuros dos ativos instrumentais e financeiros. Trata-se de converter, em cada momento, o fluxo de receitas futuras proporcionado pela posse do ativo no seu valor presente, ou seja, na única expressão admissível da riqueza capitalista, a forma monetária.
 
Não por acaso Keynes, o grande teórico da Economia Monetária da Produção, definiu a taxa de juro como o "preço" de se desprender agora da liquidez (o "poder aquisitivo geral") para investir esse dinheiro em um ativo instrumental ou financeiro e reavê-lo em data futura. A taxa de juros exprime, portanto, a maior ou menor preferência do "público" pela posse, agora, da forma universal da riqueza.
 
No âmbito da economia doméstica, o ato individual de poupar a partir de uma renda já criada é pré-condição para a acumulação de riqueza. Na esfera macroeconômica, para o conjunto da economia, a formação da renda (e a posterior decisão de poupar) depende do ânimo de gastar dos empresários, sancionado pela disposição do sistema de crédito de abrir mão da liquidez.
 
 
Fonte:Valor Online - São Paulo/SP - OPINIÃO


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